< Previous40 | AGROANALYSIS - AGO 2019 EDUARDO LEDUC Presidente do Conselho Diretor da Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef) A adoção de tecnologia, as boas práticas agrícolas e uma comunicação transpa- rente com a sociedade são essenciais para a reputação do alimento brasileiro. Tivemos um aumento significativo na produtividade das lavouras. O Projeto de Lei (PL) nº 6.299 dá eficiência ao processo regulatório com rigor científico. Nessa era do chamado protagonismo do consumidor, o cidadão deseja definir o seu padrão de consumo. A imprensa terá um papel relevante nisso. Vamos traba- lhar para que a agricultura brasileira tenha a imagem e a reputação que merece. VALDEMAR FISCHER Presidente do Conselho Diretor da CropLife Latin America Com o crescimento do comércio inter- nacional de alimentos, cabe uma refle- xão sobre inovação e sustentabilidade. O desafio da agricultura brasileira con- siste em atender essa demanda global com a qualidade requerida pelos países compradores. De forma brilhante, o governo federal muda a narrativa da agricultura. Isso faz jus ao trabalho de- senvolvido pelo setor, com o esforço do agricultor, a pesquisa e a indústria, entre outros, para que as inovações em uso em outros países cheguem mais rápido ao Brasil. FERNANDO SILVEIRA CAMARGO Secretário da Secretaria de Inovação, Desenvolvimento Rural e Irrigação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SDI/MAPA) Inovação e sustentabilidade são um duo importante para aumentar a produtividade sem aumentar a área e destruir a natureza. O MAPA e o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) estão criando a Câmara da Agricultura Digital – Agricultura 4.0 – no esforço de termos tecnologia embarcada com acesso à internet no campo. O tema de defensivos traz três benefícios funda- mentais: primeiro, o de propiciar ganhos FÓRUM INTERNACIONAL INOVAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE NA AGRICULTURA Eduardo Leduc, presidente do Conselho Diretor da Andef CONTEÚDO ESPECIAL Da esquerda para a direita, José Perdomo, Caio Carbonari e Elizabeth Nascimento SHODO YASSUNAGA SHODO YASSUNAGA41 CONTEÚDO ESPECIAL de produtividade, com o acesso a novos princípios ativos; segundo, o da seguran- ça do aplicador; e terceiro, na questão do ‘ambientalmente correto’. ELIFAS CHAVES GURGEL DO AMARAL Ministro substituto do MCTIC A Telebras tem instalado vários pontos de acesso à internet para aumentar a pro- dutividade da agricultura. É importante que a população saiba que consome alimentos de qualidade com segurança. O Brasil dá mostras claras à comunidade internacional da sua competência na produção primária. O setor depende dos insumos para produzir alimentos além do nosso consumo e exportar. MARCOS MONTES Ministro interino do MAPA A nossa preocupação concentra-se na busca de mercados e na proteção dos produtores. Temos um problema na imagem externa e precisamos convencer a própria sociedade brasileira. Superar a barreira da desinformação é um desafio. Precisamos dos defensivos para prote- ger o produtor. Há uma sintonia muito forte entre o MAPA, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Vamos derrubar o discurso do veneno na comida das pessoas. Não podemos gastar mais tempo com assun- tos técnicos já superados. MODERNIZAR PARA GARANTIR A SEGURANÇA O PAPEL DAS AGROTECNOLOGIAS NA SEGURANÇA ALIMENTAR JOSÉ PERDOMO Presidente executivo da CropLife Latin America Devemos esforçar-nos para levar as melhores tecnologias de produção aos agricultores. A comida faz um longo caminho até chegar aos mercados. Na proteção das culturas, as companhias investem US$ 7 bilhões por ano. Isso equivale ao orçamento da Costa Rica ou de El Salvador e Honduras. Nos alimentos geneticamente modificados, a posição do Brasil é a de segundo maior produtor do mundo. Nos últimos vinte anos, assistimos ao lançamento dos produtos biológicos para controle de pragas e doenças. De um modo geral, a nanotecnologia aumenta a eficiência do produto com doses menores e mais especificidade. Governo, indústria e distribuição pre- cisam trabalhar em conjunto na regu- lamentação dos produtos e na educa- ção do agricultor. O mundo precisa de comida saudável e barata, e devemos produzir mais em menos área. Os nossos desafios focam os agricultores pequenos com pouca tecnologia e baixa produtividade. Com a migração para as cidades e o envelheci- mento da população no campo, a tran- sição passa por boas práticas, controle de pragas e doenças, conservação de solo e água etc. No mundo, 30% da população trabalha no campo e 50% da comida produzida é feita por 500 milhões de pequenos agricultores, dos quais 40% são mu- lheres. Qualquer aumento em sua pro- dutividade resultará em muito aumento na produção de alimentos. A CropLife Latin America atua em dezoito países, com 25 associações. Na área de alimentos, no mundo, a América Latina participa com 13% da produção e 16% nas exportações de alimentos, com 24% da terra arável, 30% da água doce e 25% das florestas. BRASIL: INFORMANDO CORRETAMENTE SOBRE O USO DE DEFENSIVOS AGRÍCOLAS CAIO CARBONARI Professor na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), campus de Botucatu Sobre o uso dos defensivos agrícolas, como existe uma grande desinformação, cabe uma análise pragmática, fundamen- tada em dados e conhecimento. Na agricultura brasileira, houve um des- colamento entre as curvas de produção e de plantio, com produção maior numa mesma área. Houve intensificação da tecnologia, com melhoramento genético das plantas, avanço na mecanização e maior uso dos insumos. Os defensi- vos agrícolas, por exemplo, ao evitar as perdas promovidas por pragas, doenças e plantas daninhas, possuem um papel estratégico nesse contexto. Contamos com 32 milhões de hecta- res cultivados sob sistema de plantio direto, com preservação da cobertura morta sobre o solo. Realizamos duas safras em boa parte das áreas agrícolas. 42 | AGROANALYSIS - AGO 2019 CONTEÚDO ESPECIAL Aproveitamos melhor as condições climáticas existentes. Na cana-de-açúcar, 80% da área plantada, de 8 milhões de hectares, não é mais quei- mada, enquanto a colheita mecanizada preserva a cobertura morta sobre o solo, com benefícios ambientais positivos. O superávit do agronegócio na balança comercial brasileira mostra o impacto do Brasil sobre a segurança alimentar mundial e o papel estruturante do setor para a economia nacional. Temos atestado de qualidade para produzir e exportar a mais de 160 países. Por tudo isso, cabe à sociedade brasileira garantir a competiti- vidade e a sustentabilidade da agricultura. De 2013 a 2017, o uso nacional de de- fensivos caiu 12,5%, enquanto subiu nos Estados Unidos, na China e na Índia. Enquanto, na França, diminuiu um pouco; no restante dos países, man- teve-se no mesmo nível. Quando dividimos a quantidade consu- mida pela área plantada, a interpretação muda. O Brasil cai para a sétima posição, atrás de Japão, Coreia, Alemanha, França, Itália e Reino Unido. Se divi- dirmos pela produção, o Brasil vai para a 13ª posição, depois de Canadá, Estados Unidos, Argentina, Austrália, Espanha e vários países. Temos de destacar que esses países pro- duzem em clima temperado. O Brasil é o único país com uma agricultura importante em clima tropical, com desafios em termos de manejo fitossa- nitário. Não possui o inverno rigoroso do ambiente temperado para quebrar o ciclo de produção. Quando cruzamos o consumo de de- fensivos em dólar com a produtividade, o Brasil participa do grupo de países com baixo consumo de agrotóxicos e maior produtividade. Para monitorar o risco do uso dos de- fensivos agrícolas, existe o Quociente de Impacto Ambiental (EIQ, na sigla em inglês), que serve para comparar culturas, regiões e sistemas de produção. Essa ferramenta foi desenvolvida em 1992 por Kovach e colaboradores na Universidade de Cornell. Fizemos uma quantificação do EIQ para quatro culturas (milho, soja, cana e algodão), que representam 80% da área agrícola no Brasil, para o período de 2002 a 2015, em termos de hectares, número de aplicações e EIQ por apli- cação. Registramos uma queda drástica no EIQ por aplicação. Atualizamos os dados para 2016 e 2017, com queda média no risco ambiental (37%). A legislação nacional de defensivos no Brasil é de 1989, anterior à biotecno- logia, à nanotecnologia e à agricultura digital. Precisamos incorporar o concei- to de análise de risco. Temos produtos disponíveis seguros, mas a lei deve per- mitir o acesso rápido às tecnologias em curso. Dos 32 novos ingredientes ativos (IAs) no aguardo de registro para uso comercial no Brasil, muitos já são registrados nos Estados Unidos (19), no Canadá (19), na Austrália (18), no Japão (17), na União Europeia (16) e na Argentina (15). Nesses países, muitos deles estão em uso (29). Em comparação aos IAs no mercado, a média de EIQ do IA com aguardo para registro é menor (42%). Demoramos para colocar no mercado produtos mais eficientes contra vários alvos biológicos que se tornaram grandes problemas. A dose média dos produtos lançados a partir de 2000 corresponde a 12% da dose utilizada nas décadas anteriores. SEGURANÇA ALIMENTAR E USO DE DEFENSIVOS ELIZABETH NASCIMENTO Professora na Universidade de São Paulo (USP) Em 2002, Kroes afirmou que “não comer causa mais riscos à saúde do que comer e, via de regra, acarreta riscos muito maiores que os causados pela maioria das substâncias tóxicas conhe- cidas presentes nos alimentos”. Com o tempo, aprendemos a tratar e cozinhar os alimentos de forma adequada. Queremos um alimento seguro, com tempo de prateleira e com uso de aditi- vos pela indústria para servi-lo de forma adequada. Então, fica a preocupação com os contaminantes, os chamados “defensivos agrícolas”, “agrotóxicos”, “pesticidas”, “agroquímicos”. Conforme a estrutura química, a absor- ção do praguicida varia. Sempre haverá uma dose segura a que não responde- remos de forma negativa. Paracelsus, há quinhentos anos, dizia que a dose fazia o veneno. O efeito agudo acontece rápido, enquanto o crônico aparece a longo prazo. Diferente de perigo, risco é a probabilidade de acarretar um dano sob condições específicas. Em 1983, a Academia Nacional de Ciências americana desenvolveu um projeto associado à avaliação de risco, dividido em quatro fases: na primeira, estabelecia-se a dose da Ingestão Diária Aceitável (IDA); na segunda, chegava- se à relação dose-resposta; na tercei- ra, objetivava-se entender a exposição humana; e, na quarta, comparava-se a exposição humana com a IDA. Os parâmetros de índices são relevantes. Se os valores de exposição humana e a toxicidade das substâncias forem altos, as agências regulamentadoras diminuem a presença do praguicida. Existem vários sistemas de qualidade para avaliar se os alimentos são produzidos e tratados de forma adequada. A definição do 43 CONTEÚDO ESPECIAL Limite Máximo de Resíduos (LMR) é feita pelo Codex Alimentarius, aporte da Organização Mundial da Saúde (OMS), bem como por legislações de segurança alimentar de países e blocos. No Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA), do MAPA, vemos que, desde 2013, 96,65% apresentavam padrões de con- formidade com a legislação. Existem alguns problemas a ser trabalhados nas culturas com insumos fitossanitários insuficientes. O gerenciamento de risco está adequado. O problema maior está em como comunicar o risco. Há uma dificuldade em tirar a crença arraigada na sociedade de que qualquer substância pode acarretar dano. WILLIAM WAACK Moderador dos debates É curioso participar de um evento com foco em expor o avanço da tecnologia baseado na inovação. Dispomos de co- nhecimento com fundamento científico, porém temos dificuldade de fazer com que isso seja entendido e aceito. Em outras palavras, estamos diante de um problema político. Quando se referiam ao aumento de produtividade da agricultura brasilei- ra, todos referiam-se à capacidade de utilizar melhor os recursos, sem que a sociedade entendesse. Também quando apresentam os ganhos nos aspectos de toxicidade, defrontam a resistência da política cultural. Temos decisões no Parlamento, como o PL nº 6.299. Trata-se de uma matéria de enorme impacto do ponto de vista político. A expectativa corre no sentido de que os votos dos deputados federais sejam em nome da Ciência, no sentido de melhorar a legislação. Isso permitirá o uso da inovação tecnológica para a continuidade dos ganhos de produti- vidade da agricultura. Os depoimentos são de que há uma perda na guerra da comunicação. Fomos relapsos? Ficamos fechados no círculo dos convertidos. O Greenpeace anuncia que houve a liberação de mais 239 pro- dutos classificados genericamente como defensivos agrícolas. Isso repercute entre os não convertidos. O que o setor faz? Em quem os alunos acreditam? JOSÉ PERDOMO Erramos em comunicar de uma maneira científica o nosso conhecimento. Falamos muito para nós mesmos. A sociedade não entende os detalhes dos benefícios da indústria. Precisamos buscar aliados e realizar eventos desse tipo. É um processo de educação. ELIZABETH NASCIMENTO As crenças na sociedade são mais fortes. No Canadá, havia a figura do médico Dr. Nantel para explicar e mostrar solu- ções para a contaminação dos lagos. Ele usava uma linguagem muito especial. Vemos com muita tristeza esse quadro atual de descrença em vários países. Muitos estudos científicos mostram, nos últimos anos, a descrença da sociedade em relação ao Governo, à imprensa, à Academia etc... Na Toxicologia, temos os conceitos de perigo e de risco. Por exemplo, a tesoura, como pode causar dano, precisa ser usada com cuidado. CAIO CARBONARI Perdemos a guerra da comunicação, em partes, porque deixamos de gerar informações. Fomos negligentes em apresentar dados fundamentados com estatísticas corretas. Essa comunicação com mais registros de produtos gené- ricos não possui conteúdo. A nossa argumentação é sobre moléculas novas, mais seguras e de menor risco. WILLIAM WAACK Com esse PL nº 6.299, o Brasil deixa de ficar atrasado ou aumenta o perigo para os seus habitantes? Como conversar com o deputado? Em que medida o novo governo apoia medidas para manter a competitividade do agronegócio? JOSÉ PERDOMO Como está atrasado, o PL moderni- za o sistema regulatório do Brasil no nível global das primeiras economias do mundo. A competitividade de hoje José Perdomo, presidente executivo da CropLife Latin America SHODO YASSUNAGA44 | AGROANALYSIS - AGO 2019 CONTEÚDO ESPECIAL diminuirá diante desses produtos com menor toxicidade e maior eficiência. Estamos em um momento-chave. CAIO CARBONARI O PL coloca a legislação brasileira em pé de igualdade com a existente no mundo desenvolvido. Além de acrescentar o conceito de análise de risco, que já foi incorporado há vinte anos, permite uma convergência científica e regulatória de escala mundial. Isso tem importância para o livre-comércio de produtos em termos econômicos e de segurança. ELIZABETH NASCIMENTO Uma vez, tive de falar para um juiz que determinado produto era carcinogênico. Ele perguntou: “E se o trabalhador ingerir o cimento?”. Respondi que teria uma obstrução gastrointestinal e morre- ria, com uma fala rebuscada e científica. Ele falou: “Não entendo nada.”. Passei a discorrer de maneira palatável, e fun- cionou. Os anseios de um deputado são diferentes de uma demonstração científica sobre algo perfeito. ENCERRAMENTO ALCEU MOREIRA Deputado federal (MDB/RS) e pre- sidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) Somos competidores de mercado. Cada produto menos produzido no Brasil será vendido por outro país. Existem interes- ses para nos deixar menos eficientes. Se conseguirem provar que o nosso solo do Cerrado ficará estéril, perderemos com- pradores. Dos 513 deputados federais no Congresso Nacional, a FPA conta com 289. Da população nacional, a urbana representa 85%. Precisamos trazer o deputado e o senador urbanos para o nosso lado. Montaremos uma comissão geral para discutir o Código Florestal. Lançaremos um projeto de comunicação nas Embaixadas no exterior. Trabalhamos para montar uma grande exposição em São Paulo para divulgar o nosso agro para a comunidade internacional. Com boas estratégias, venceremos a batalha no campo da comunicação. PRÊMIO ANDEF INOVAÇÃO PARA A SUSTENTABILIDADE NA AGRICULTURA O objetivo é reconhecer os profissionais de destaque na criação ou no desenvolvimento de soluções inovado- ras ou sustentáveis na agricultura com capacidade para aumentar a produtividade, a proteção à saúde humana e a preservação do meio ambiente. CATEGORIA INOVAÇÃO: Marcos Nascimbem Ferraz, engenheiro-agrônomo e mestre em Engenharia de Sis- temas Agrícolas, formado pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da Universidade de São Paulo (Esalq/USP). Trabalha na área de Tecnologia e Agricultura de Precisão há treze anos. É sócio-fundador da empresa Smart Sensing Brasil, responsável pela tecnologia por meio de sensores que identificam e acionam a pulverização das plantas, com economia no uso de defensivos agrícolas. CATEGORIA SUSTENTABILIDADE: Gherman Garcia Leal de Araujo, graduado em Zootecnia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), com Mestrado e Doutorado na mesma área pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Pós-dou- torado pela Universidade da Califórnia. A sua principal área de atuação é o Semiárido brasileiro, em projetos para gerar tecnologias que possibilitem que o produtor aumente a sua capacidade de estoque de alimento e água para os animais. CATEGORIA PERSONALIDADE: Yeda Maria Malheiros de Oliveira, engenheira florestal com Doutorado em Oxford, na Inglaterra, e pesquisadora da Embrapa Florestas há 41 anos. Faz parte da Comissão Técnica do Inventário Florestal Nacio- nal (IFN) e tem sido membra ativa da parceria com o Serviço Florestal Brasileiro (SFB) na sua concepção e na sua implan- tação. É vice-presidente do Comitê Organizador do 25º Con- gresso Mundial da União Internacional das Organizações de Pesquisa Florestal (IUFRO, na sigla em inglês). Da esquerda para a direita: Mário Von Zuben, Marcos Ferraz, Alceu Moreira, Yeda de Oliveira, Eduardo Leduc e Gherman de Araujo SHODO YASSUNAGA45 AGRONEGÓCIO: AJUSTE DE FOCO NA POLÍTICA AGRÍCOLA FÁBIO DE SALLES MEIRELLES Presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (FAESP) O AGRONEGÓCIO foi incen- tivado pelo nosso sistema de re- presentação no seu surgimento, há mais de sessenta anos. Atualmente, o setor representa 21,5% do Produto Interno Bruto (PIB) e movimenta a indústria, o comércio e os serviços, gerando empre- gos e renda, principalmente no interior do Brasil. Ele promove a interiorização do desenvolvimento nacional; é sinôni- mo de progresso. Apesar dos resultados positivos do setor, a percepção corrente dos pro- dutores é que as conquistas se devem, preponderantemente, ao empreendedo- rismo dos agentes econômicos, consi- derando que as ações do setor público têm estado aquém da retribuição do setor à economia. Grande parte do sucesso do setor resulta dos valiosos investimentos na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e em órgãos estaduais de pesquisa e das políticas de crédito, assistência técnica e apoio à co- mercialização implantadas há décadas. Contudo, a correlação entre o produto da atividade agropecuária e as políti- cas públicas vem enfraquecendo-se ao longo dos anos. Na gestão do novo governo, até por conta do desequilíbrio das contas públicas, há a oportunidade de realinhar as políticas e as estratégias às necessi- dades do setor, a fim de impulsionar a sua modernização em pilares susten- táveis de crescimento, assentados na economia de mercado. A aprovação da reforma da previdên- cia é crucial para o equilíbrio fiscal e a atração de investimentos estrangeiros para a área de infraestrutura. A reforma representará um ponto de inflexão na retomada do crescimento e deve es- tabelecer as condições básicas para a implantação de uma política baseada em instrumentos de mercado, sobretudo para o crédito e o seguro rurais. O Plano Agrícola e Pecuário (PAP) 2019/2020, frente à restrição orça- mentária imposta pelo Ministério da Economia, expôs um novo viés em termos de política agrícola. O plano é pontual, mas sinaliza a tendência para os próximos anos, uma vez que a pro- gramação de financiamento privado com recursos livres se elevou conside- ravelmente, bem como o incentivo ao seguro rural como mitigador de risco. O cenário econômico que vem se de- lineando levará o Brasil a ter taxas de juros bem próximas das praticadas por países desenvolvidos, criando um am- biente saudável, de maior concorrência e menor dependência de subvenções ao crédito. O seguro, como instrumento de administração do risco climático e de mercado, pode concorrer para reduzir os spreads e fomentar o mercado de crédito privado para o agronegócio. A transição para esse modelo não pode ser abrupta, pois é preciso desenvolver o mercado e garantir a adaptação dos agentes ao novo ambiente de negócios. A semente está plantada com o PAP 2019/2020, que aumentou os recursos do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) para R$ 1 bilhão em 2020 e que pode contar com até R$ 2 bilhões no ano seguinte a depender da evolução do mercado, segundo a ministra da Agricultura, Tereza Cristina. A intenção do governo vem ao encontro da demanda da FAESP, que, há anos, clama por maior apoio ao seguro rural e políticas sólidas de sustentação de renda para os produtores rurais, que são a base do agronegócio. Produtores, seguradoras, ressegura- doras, corretores e agentes do setor precisam trabalhar juntos pelo seguro rural. Deve-se aproveitar a conjuntura favorável e contornar os entraves que impedem a sua expansão. É o momento de garantir definitivamente a consoli- dação desse instrumento no cerne da política agrícola brasileira. COLUNAS 46 | AGROANALYSIS - AGO 2019 Na agricultura, temos excelentes enge- nheiros-agrônomos, médicos-veterinários, engenheiros flores- tais e zootecnistas, mas faltam téc- nicos, como, por exemplo, agrimensores. A EDUCAÇÃO é tema recorrente em conversas de qualquer brasileiro media- namente informado, e sempre se conclui que o País não fez a sua lição de casa quanto a ele, o que explicaria grande parte do nosso baixo crescimento. Também é frequente a compara- ção entre o nosso progresso e o observado em países que investiram bastante em educação, e fica evidente o quanto ficamos para trás. A própria produtividade do trabalho no Brasil é baixa em função desse fato, de modo que nada é mais consensual do que a necessidade de investir em educação. O pior é a certeza de que precisamos fazer muito mais do que fizemos, e, mesmo que o façamos imedia- tamente com bastante vigor, os resultados demorarão mais ou menos uma geração para ser sentidos por todos. Atualmente, cerca de 83% dos nossos jovens não vão para o Ensino Superior, e há uma correlação entre essa estatística e a violência. Segundo o Atlas da Violência publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em 5 de junho passado, “a morte violenta intencional de jovens entre 15 e 29 anos aumentou 38% no período [entre 2007 e 2017]. Em 2017 representou 54% do total dos homicídios”... Outro alerta evidente: o desemprego chega a 30% entre os jovens até 24 anos, sendo que, mesmo com o desaqueci- mento da economia global, a média planetária nessa faixa de idade é de 13%, bem menos da metade da nossa... Ora, se apenas 17% dos nossos jovens chegam à universidade, o que estamos fazendo por todos os demais? Entre os países-mem- bros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), 44% dos que não vão ao Ensino Superior conectam-se com o mundo do trabalho via Ensino Médio, por meio do ensino profissional e tecnológico. E, no Brasil, esse número está em trágicos 9%! Aqui está um ponto para reflexão. O Governo já preocupou-se com isso: no final de 2018, foi aprovada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que enfatizou essa questão, podendo melhorar mais rapi- damente o nosso desempenho profissional num futuro próximo por meio da educação técnica em larga escala. Na prática, a nova Lei abre uma porta de entrada para jovens num momento crítico de suas vidas, acenando para a sua prosperidade e a de suas famílias. A partir de 2020, todas as escolas deverão oferecer opções para o Ensino Médio, em cinco macrocampos, chamados de “itinerários formativos”. Quatro deles são acadêmicos, e um é de educação técnica. De fato, faltam técnicos de nível médio. Na agricultura, temos excelentes engenheiros-a- grônomos, médicos-veterinários, engenhei- ros florestais, zootecnistas, mas faltam, por exemplo, agrimensores. Nas cidades, dá-se o mesmo: temos engenheiros e arquitetos, mas faltam técnicos em hidráulica, em ele- tricidade, em automação e em segurança. A economia real anseia por esses profissionais, e, em muitos casos, a remuneração deles é maior do que a dos de nível superior. E há um pormenor: técnicos com essa formação estão conectados com as realidades regionais e territoriais, podendo promover mudanças simples que resolvam demandas não solucio- nadas até então. A ONG Todos Pela Educação avalia que 95% dos estudantes secundaristas querem conhecer a educação técnica. Mãos à obra: temos que montar uma política educacional para o ensino profissional e tec- nológico. Ele é emancipador para os jovens e altamente progressista para o País. DIÁRIO DE BORDO EDUCAÇÃO PROFISSIONALIZANTE ROBERTO RODRIGUES Coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getulio Vargas (FGV Agro) e embaixador especial da FAO para as Cooperativas COLUNAS 47 “…é preciso reconhecer que a retirada completa ou parcial das tarifas melhora a competiti- vidade dos produtos brasileiros em relação aos concorrentes.” PRODUZIR ACORDO MERCOSUL- UE ABRE NOVA ERA DE OPORTUNIDADES MARCELO VIEIRA Presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB) O ACORDO entre o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) e a União Europeia (UE), oficializado no fim de junho último, pode abrir portas para uma nova era do nosso agrone- gócio. Antes de tudo, é histórica a sua conclusão após vinte anos de longas negociações. Além disso, representa um passo importante rumo ao processo de modernização e abertura eco- nômica para o Brasil. Trata-se de um empurrão que tira o MERCOSUL da zona de conforto, aproximando o bloco de um mercado con- sumidor importante. É preciso ponderar, no entanto, que o tratado, sozinho, não assegura a expansão das exportações nacionais. Com a oficialização do tratado, é notório que algumas cotas agrícolas são basicamente as mesmas que os europeus ofereciam há duas décadas, ainda longe da nossa pretensão inicial. Estão, sobretudo, abaixo do esperado as menos de 100 mil toneladas para carne bovina e as 180.000 toneladas para açúcar, valor este considerado pequeno até para um produtor significativo, pois o Brasil exporta para o mercado uma média de mais de 25 milhões de toneladas anuais. Devemos considerar, antes de tudo, que a economia do MERCOSUL deverá crescer, o que, consequentemente, ampliará o tamanho do mercado obtido de forma preferencial pelos europeus. Segundo a experiência dos melhores experts, se esse acordo tivesse sido fechado há vinte anos, quando iniciamos essas negocia- ções, teríamos, hoje, um acesso significativo ao mercado europeu. Outro ponto preocupante é um possível “prin- cípio de precaução”, que dá à UE a possibili- dade de impor restrições sem fundamentação científica caso o MERCOSUL não consiga provar que as exportações são livres de danos. Esse pode ser um precedente perigoso na questão ambiental, em que as verdades são mais complexas de provar. Cabe ressaltar que a versão europeia não cita abertamente a exis- tência de um “princípio de precaução”, mas lista o Acordo de Paris e a Moratória da Soja como práticas que serão observadas no acordo. Segundo dados divulgados pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO, na sigla em inglês), o Brasil tem um dos índices mais baixos de uso de defensivos por hectare entre os grandes pro- dutores de alimentos, mas é continuamente criticado como se os seus produtos fossem perigosos. Se considerarmos o uso por quilo de alimento produzido, o País seria ainda mais seguro, pois a sua produtividade por hectare é muito acima da média mundial. Além disso, é divulgado como tendo produtores desmata- dores pelo crescimento de sua produção, sem se levar em conta que tem uma legislação am- biental mais exigente e preserva um percentual maior do seu território em relação aos demais países. Vale lembrar, ainda, que o Brasil já é o maior exportador líquido de alimentos do Planeta se considerarmos exportações menos importações e que, nas próximas décadas, será o principal supridor das áreas com deficiência alimentar, reduzindo a fome no mundo. Apesar das ponderações, é preciso reconhecer que a retirada completa ou parcial das tarifas melhora a competitividade dos produtos bra- sileiros em relação aos concorrentes. Nos últimos anos, países como México, Canadá, Austrália e Indonésia vinham firmando bons acordos e ampliando sua participação no mercado mundial. É importante comemo- rar o acordo, que pode não atender todas as nossas necessidades de uma boa relação comercial com os europeus, mas inicia um relacionamento que deverá ser renegociado sempre que possível. COLUNAS 48 | AGROANALYSIS - AGO 2019 A visão dos prefeitos, muitas vezes, termina quando não há mais luz elétrica e ruas asfal- tadas, mas é preciso lembrá-los que é do campo que vêm os alimentos para toda a população urbana. “ MERITOCRACIA”: ESSA é a palavra de ordem para os municípios paulistas. Em julho, mês em que se comemora o Dia do Agricultor, premiamos as cidades mais bem avaliadas em um ranking que leva em considera- ção apenas critérios técnicos. Trata-se de mais uma ação concreta do programa Cidadania no Campo 2030 na busca de promover o desenvolvimento do estado de São Paulo por meio do agronegócio. Os dez primeiros colocados receberam mais de R$ 1 milhão, com premiações que variam de R$ 62 mil a R$ 500 mil. O ranking foi feito levando em consideração dez diretrizes que deverão ser atendidas pelos municípios para melhor pontuação, sendo elas: desenvolvimento rural sustentável; interação campo-cidade; in- fraestrutura rural; estrutura institucional; solo e água; resiliência e adaptação às mudanças climáticas; defesa agropecuária; biodiversidade; abastecimento e segurança alimentar; e fortale- cimento social. A partir de agora, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo passa a celebrar novos convênios com os municípios interessados para as próximas edições, que ocorrerão anualmente, e destinar recursos baseados em critérios técnicos. Mesmo em São Paulo, estado mais rico da Federação, onde o agronegócio corresponde a 20% do Produto Interno Bruto (PIB) do agro nacional, a visão dos prefeitos, muitas vezes, termina quando não há mais luz elétrica e ruas asfaltadas. Apesar disso, precisamos lembrar que é do campo que vêm os alimentos para toda a população urbana. E é o campo, também, que movimenta o PIB das cidades de interior, promovendo o desenvolvimen- to socioeconômico, com geração de renda e empregos. O agro é, em muitos municípios, a locomotiva que sustenta a economia. Nesse cenário, é imprescindível que cada município olhe para a zona rural e pense em políticas públicas voltadas ao desenvolvimento e à transformação do campo, levando a ele serviços e estruturas básicos, como segurança, mobilidade, conectividade, preservação am- biental e saneamento. O convênio Cidadania no Campo 2030 busca, justamente, orientar e dar diretrizes para as Prefeituras implemen- tarem as políticas públicas voltadas ao desen- volvimento da área rural. Precisamos unir esforços, integrar: estado e município, cada um com o seu foco de atuação, mas alinhados na mesma direção para apri- morar o desenvolvimento do agronegócio paulista, gerar riqueza e empregos e melhorar a qualidade de vida daqueles que trabalham e moram no campo. Trata-se de mais uma medida da gestão do governador João Doria orientada pelo conceito de municipalização. A Secretaria de Agricultura passa a ocupar uma posição de consultora e orientadora das políticas públicas para o agronegócio. E, por outro lado, cada município passa a implementar e executar os projetos e as ações tanto para atingir boas pontuações e ser premiado com recursos financeiros, quanto para ser beneficiado com a preferência na par- ticipação de outros programas da pasta, como o Programa Melhor Caminho. Premiando os melhores, engajaremos os demais a definirem políticas públicas voltadas ao desenvolvimento rural sustentável e replicarem as boas práticas dos municípios vencedores. É São Paulo demonstrando que, após um profundo aprendizado sobre o agronegócio, as áreas rurais e as necessidades da popula- ção, é imperiosa a elaboração de políticas públicas integradas aos municípios, que atendam os anseios da população e valori- zem o trabalho e as riquezas gerados pelo agronegócio, independentemente de parti- darismo e ideologias. OPINIÃO GESTÃO MUNICIPALISTA NO CAMPO GUSTAVO DINIZ JUNQUEIRA Secretário da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São PauloCOLUNAS 49 “Para o MERCOSUL, o acordo [entre MERCOSUL e UE] elimina as tarifas sobre 92% das expor- tações para a UE e concede ‘tratamento preferencial’ para os 8% restantes.” REFLEXÃO IMPORTANTES AVANÇOS MARCELLO BRITO Presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) D OIS ACONTECIMENTOS marca- ram os meses de junho e julho para o Brasil. O primeiro foi a assinatura do acordo entre a União Europeia (UE) e o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL). O segundo, e não menos importante, foi a aprovação, em primeiro turno na Câmara dos Deputados, da proposta de reforma da previdência enviada pelo governo Jair Bolsonaro. Uma das mais longas negociações comerciais, o acordo entre a UE e o MERCOSUL começou a ser discutido em 28 de junho de 1999 e foi concretizado exatamente vinte anos depois, em 28 de junho de 2019. E o que esse acordo significa exatamente? Basicamente, cria um mercado de 800 milhões de pessoas para bens e serviços. Em termos de redução de tarifas, espera-se que os impostos sobre as exportações da UE para o MERCOSUL sejam cortados em R$ 20 bilhões por ano. Para o MERCOSUL, o acordo elimina as tarifas sobre 92% das ex- portações para a UE e concede “tratamento preferencial” para os 8% restantes. O Brasil e os demais países do MERCOSUL terão maior acesso ao mercado europeu de pro- dutos agrícolas, especialmente carne bovina, aves, açúcar e etanol. A nossa expectativa é de que as tarifas sobre suco de laranja, café instan- tâneo e frutas sejam zeradas. Da mesma forma, a UE terá vantagens em relação ao restante do mundo nas vendas para o MERCOSUL, com redução de impostos para 91% dos bens que as empresas europeias exportarem para o bloco – um passo importantíssimo para o Brasil, sem sombra de dúvida. O MERCOSUL e a UE trabalharam inten- samente, nesses últimos anos, para fechar o acordo. Trabalho este que merece todo o nosso reconhecimento, principalmente em relação ao atual governo, que contribuiu para o desfecho positivo dessa negociação. O acordo vem enfrentando resistência de países que garantem a seus produtores rurais subsídios como preço mínimo, juros baixos e outros benefícios. Com certeza, não teremos vida fácil para colocar os nossos produtos nesses mercados. Portanto, é fundamental que estejamos preparados para as regras desses exigentes parceiros comerciais. Já em Brasília, com placar expressivo de 379 a favor e 131 contra, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma da previ- dência foi votada na Câmara dos Deputados em primeiro turno. O texto aprovado pelos deputados, que ainda pode ser alterado, estima uma economia em torno de R$ 900 bilhões nas despesas da previdência em dez anos. Para que as regras passem a valer, ainda será necessária uma segunda votação na Câmara e que, depois, ela seja referendada no Senado. A caminhada ainda é longa, mas, se seguir nessa trajetória de equilíbrio das contas públicas e abertura de novos mercados internacionais, a economia brasileira terá um novo fôlego para avançar e se fortalecer. Isso mostrará o amadu- recimento do Brasil como um país que pensa a longo prazo e que se planeja para o futuro. No que depender do agronegócio, como um dos setores que mais contribui para o Produto Interno Bruto (PIB) do País, ele fará a sua parte para atender as demandas e as expectativas de produzir cada vez mais com sustentabili- dade, cumprindo exigências dos mercados e investindo em inovação para o aumento da produtividade das suas cadeias produtivas. Next >